3 de março de 2011

A inflação distante do umbigo da blogosfera

A Presidenta surpreendente
Durante o ano de 2010 muitos blogs, apelidados aqui e ali de “sujos” ou “progressistas” dedicaram-se a desmontar o pensamento único da grande mídia (que por sua vez recebeu a jocosa alcunha de PIG.)
Mas quem vai desmontar o pensamento único da blogopauta? Não parece contraditório que uma candidata a presidente, Dilma, tenha sido tão elogiada por meses e... surpresa! Assim que toma possa é crítica atrás de crítica. Há exceções, claro.
Critica-se tudo, a escolha dos ministérios, as composições no Congresso, as presenças na mídia, pretensos recuos (no caso, recuos em relação a coisas que ela nunca prometeu ir atrás, diga-se.)
É curioso criticar-se a presidenta até por se deixar elogiar na mídia. Ora, o que se queria? Que o Planalto plantasse menções negativas através de assessoria de imprensa? Que a velha mídia só criticasse e aí sair em socorro?
O poder dificilmente muda de mãos, não é necessário lembrar disso. O que às vezes muda é a orientação de governo, que pode interferir em políticas de Estado e leis. Mas pode existir adesismo também, normal. A melhor piada que li esta semana foi  no twitter : “Tive que sair por dez minutos... Mais alguém aderiu ao governo?”
É claro que surgem 476 explicações do porquê estar tudo errado agora (passados apenas 2 meses da posse) e razões para estarmos pessimistas (eu não estou.) Nesse irrestrito gosto por teorias de conspiração, acaba se perdendo o gosto pela informação. (E, alguém anda checando a audiência de blogs, número de visitas, de comentários, etc?)
O horror do aumento da Selic
Muito barulho agora em torno de taxas de juros. Foi para 11.75% tsc tsc. É mandatório falar por todos os lados que os gastos anuais de juros (brutos) equivalem a XX Bolsas-família. Comenta-se das tendências neoliberais “deste” governo, do pensamento único da mídia e dos bancos pautando o mesmo... Mas porque ninguém lembra que existem impostos sobre os juros, especialmente o inflacionário, e que depois disso sobra só ¼ do rendimento?
Vamos raciocinar : o governo prometeu continuísmo à população se elegesse Dilma. Continuidade é o que terá. Ela prometeu convergência às taxas internacionais de juros para emergentes em 4 anos (eu ouvi isso no Roda Viva, mas não ouvi ela dizer que seria em 2011.) Ela prometeu combater inflação, e é isso que fará. Independente de eu ou mais alguém acharmos inflação um mal menor, o que conta é o que o povo espera. O que cabe falar é sobre ferramentas para isso.
Mas não se pode perder o discurso que denuncia o “poder dos rentistas”, então fica quase interditado falar que existe (ainda!) inflação no Brasil. E que ela está aumentando. Vamos torcer para que alimentos, algodão e petróleo caiam de preço nos próximos meses, mas não dá pra ter isso como certo. (Ah, falar que o desemprego é baixo e que há restrições para o desenvolvimentismo agora também não é de bom tom...)
De qualquer modo, o que temos:
- as elevações recentes de juros são bem menores que a elevação da inflação (o INPC passou de 4,3% até ago/10 para 6,5% em jan/11; a Selic líquida de IR, acumulada em 12 meses, passou de 7,4% para 8,4%. O que subiu mais?)
- as taxas nominais e reais de juros caíram substancialmente desde 2006 (e mesmo assim o Real continuou apreciando, então esqueça-se esse mito de que basta baixar juros para desvalorizar);
- desde nov./2010 o ganho líquido dos rentistas está abaixo de 2% a.a., há 3 anos em torno de 4% a.a. ou menos (qualquer bolha imobiliária é coincidência...)
- os juros reais da Caderneta de Poupança (algo reverenciado pela população), mesmo isentos de impostos, não passam de 2% ao ano desde 2007, com risco de se tornarem negativos agora;
- ainda existe uma identidade macroeconômica que diz que Poupança (S) = Investimento (I). Ou seja, não será diminuindo a atratividade da poupança que se elevarão os investimentos.


As alternativas à política monetária
É um problema para Dilma, Mantega e Tombini administrar, entre tantas outras questões, uma inflação que se avizinha dos 7% (4% apenas nos últimos 5 meses), o que não se via desde 2008.
Muitos críticos do governo dizem saber que política monetária não resolve para lidar com inflação. Não duvido. Ok, com eles a palavra: se não é para manter juros reais positivos, o que é para fazer?

5 comentários:

  1. Gunter, exemplificando, para ficar mais claro.
    Se um investidor fizer um CDB em qualquer banco e conseguir a taxa máxima, isto é, 100% da taxa SELIC, teremos:
    rendimento bruto: 11,75% a.a.
    menos 22,5% de IR: 2,64%
    rendimento líquido: 9,11% a.a.
    menos a inflação: 6,50% (estimada)
    renda efetiva: 2,61% a.a.
    (se a inflação vai a 7%, a renda seria de apenas 2,11%)

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  2. Há muito a fazer. Aumento de juros é cosmético, na situação atual. É preciso premiar o capital produtivo, apertar o cinto do crédito para valer. Dói? Dói, mas é preciso para o desastre não ser maior ali adiante. E inflação? Nem pensar. Vivi 25 anos de inflação descontrolada e não quero nem ver sombra disso de novo. Um bom exemplo de falta de ação competente foi a pífia atualização da tabela do IR, que até pareceu uma decisão de última hora, impensada e que, juntamente com outras ações - tantas já adotadas em várias partes do mundo, poderia implicar manutenção de poder compra sem riscos inflacionários, empregabilidade, investimentos,etc.

    A administração atual está muito no início ainda. Espero que a Presidente Dilma ache seu caminho próprio, e seja fiel a ele, independente de pressões partidárias.

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  3. Bom dia!
    @Luiz Fernando. É isso, mas se aplicar por um ano o desconto é só 15%. Como todos os fundos já têm valores a resgatar com mais de um ano há um mecanismo que permite que os investidores já consigam isso após um mês, na prática essa taxa de 22,5% para aplicações curtas não sei se é usada.
    @Miriam. A tabela do IR sendo reajustada de última hora em 4.5 penaliza o trabalhador, pois a inflação em 2010 foi 6.5... Mas faz parte do ajuste fiscal. O ponto é esse, a maioria da população não quer que a inflação volte (embora em 2008 chegou a 8% e quase não notamos.) Mas há sites na blogosfera pregando a irrelevância da inflação e que juros não deveriam aumentar, só que sem apresentar alternativas. isso não é nem partidário, é dogmático, espero que Dilma não caia nessa (e não vai!)

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  4. Inacreditavel não? Estou até pensando em reabrir um certo blog pra combater essa "esquerda tapada" e esses "blogprog" q fingem não ter interesses "ocultos".

    Ela está fazendo o que tem que ser feito, seja na política, seja na economia.

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  5. @Fernando
    Eu tive dois comentários não publicados ontem em um blog. Quero crer que se trata só de problema técnico...
    Um era para falar que a blogosfera virou pensamento único, outro pra dizer que nos artigos não se faz o contraponto de lembrar do problema da inflação. Com o meu estilo "Poliana/MaryPoppins/NoviçaVoadora", ou seja, nada que pudesse ofender alguém.

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